COMPETÊNCIA SOCIOEMOCIONAL E O TRABALHO DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR

COMPETÊNCIA SOCIOEMOCIONAL E O TRABALHO DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR

Por

Maria José Costa dos Santos

Os direitos e os deveres de professores e alunos – um termina quando começa o do outro, mas quem delimita essa linha tênue? Não há solo nivelado para discussão sobre essa questão, pois nem sempre é tranquila, harmoniosa, e em algumas vezes é a ciência a ser ensinada que determina essa relação professor-aluno, e, os processos de ensino e de aprendizagem passam por dificuldades e são desafiados por esses fatores. Algumas vezes o professor em busca de ‘incentivar’ o aluno, o desmotiva, com simples frases como reforçar o ‘quão ele é inteligente’, e isso deixa o aluno em situação difícil, pois o professor exige que ele deveria saber algo que ele ainda não sabe, isso é angustiante para o aluno, mas o professor não percebe, pois entende que o que fez foi apenas um elogio. Assim, sempre que for elogiar um aluno, tenha certeza de que o ato elogiável se aplica a qualquer aluno na sala de aula, e não está nem aquém e nem além de suas habilidades. É comum, porém inaceitável, agressões nos ambientes escolar ou acadêmico, seja de professor para aluno, aluno para professor, aluno para aluno e entre professores. Os cases são os mais absurdos, vejamos esses, por exemplo, 1) “o professor de 62 anos, ficou com o rosto ensanguentado após episódio de violência na sala de aula, em Lins (SP). “ 2)“ Dois alunos, que apresentavam problemas de comportamento recorrentes, iniciaram uma briga em sala de aula. Ao tentar apartar os estudantes, a professora foi agredida e fraturou o osso do antebraço.” 3)“Professor de 41 anos, foi morto a tiros por um aluno, após uma discussão.” Essas são algumas manchetes de jornais, mas sabe-se que o índice de violência nesses ambientes tem aumentado de forma alarmante e desesperadora – progressão da agressão física (7%)(2022). Alguns tipos de violência por não serem físicas, apesar de comuns, são invisibilizadas, por serem em algumas vezes difíceis de serem comprovadas, mas causam o mesmo estrago a vida das pessoas ou até maior, como: bullying (22%), discriminação (6%), furto/roubo (4%), agressão verbal (48%), assédio moral (20%) entre outras. O fato é que a escola que deveria ser o ambiente seguro e amoroso, torna-se um ambiente inóspito e inseguro. No Ensino Superior, tem violência? Na academia muitas vezes a violência ocorre em forma de trotes agressivos, racismo, homofobia, bullying, assédio moral, assédio sexual, etarismo, estupro e até morte. Recentemente, foi divulgado nacionalmente, o caso da aluna que foi discriminada por estar no ensino superior aos 40 anos. Assim, é necessário discutir sobre a emoção, a razão e a afetividade não só nas escolas, mas também na academia, no ensino superior e seus impactos nos processos de ensino e de aprendizagem. Visando entender os desafios no combate à violência, seja ela de que forma for visando cultivar a empatia entre os pares, a fim de fortalecer o tripé humano que sustenta a universidade, a saber: professor, técnico e estudante. Recentemente na academia, em 2022, uma professora foi ultrajada por seus pares, por julgarem que defendia um modelo de universidade, que representava segundo eles, um modelo perverso, e por suas próprias conclusões e julgamentos, sentiram-se no direito de dizer a professora que ela deveria pedir para sair do seu ambiente de trabalho, e continuaram as ofensas, “você não tem vergonha?” “você não nos representa”, você deveria pedir para sair, “todos aqui concordam que você deveria sair”, e em meio a um silêncio relevador, de um público que apreciava naquele momento as agressões verbais e psicológicas, uma ainda se pronunciou e confirmou que ‘sim’. Esse cenário de uma atmosfera inóspita que deveria ser de diálogo, de empatia, do respeito às diferenças, favoreceu e propagou discursos de ódio, rompeu paredes e contaminou alunos. Essa professora teve seu carro riscado nas dependências acadêmicas. Poderia ter sido algo mais sério? Pode-se inferir que esse coletivo de pessoas emocionalmente abalado não compreendeu a dimensão e ferocidade de suas ações. Se as competências socioemocionais são habilidades e conhecimentos relacionados às emoções humanas, as quais envolvem o uso de estratégias, atitudes e valores a serem desenvolvidas visando saber reconhecer, respeitar e lidar com os próprios sentimentos, como essas pessoas, podem formar pessoas equilibradas? Para combater esse tipo de comportamento na sociedade, deve-se ensinar desde a infância, o autocontrole emocional. Uma pesquisa intrigante realizada nos EUA, sob a égide do psicólogo W. Mischel, no final da década de 1960, tratava sobre um experimento em que dava para crianças duas alternativas, elas deveriam escolher entre receber imediatamente um marshmallow ou esperar alguns minutos para ganhar dois marshmallows. Várias crianças foram observadas por alguns anos, e verificou-se que as que optaram por esperar, tinham mais predisposição para o sucesso na vida profissional, ou seja, o estudo apontou que trabalhar o autocontrole desde a infância, pode ser muito importante para a vida adulta, comprovando nossa tese. Portanto, saber lidar com as emoções é um forte aliado no processo de autodesenvolvimento pessoal e profissional. A tolerância e a empatia representam o que nos diz Rubem Alves(2008, p. 43) “É preciso que aquele que pensa não se esforce em persuadir os outros a aceitar sua verdade… (Esse é) o lamentável caminho do ‘homem de convicções’.” Mas em vez disso, devemos (…) inspirar um outro pensamento, pôr em movimento o pensar.” Deve-se permanentemente buscar o autoconhecimento, mas não basta apenas reconhecer e entender as emoções, é necessário que saiba o que vai fazer com elas, sempre com empatia, e se perguntando – estou me comunicando de forma não-violenta? Só assim, em situações de confrontos em que o professor precise lidar com os desafios socioemocionais dos sujeitos da sala de aula, em que pode ocorrer o rompimento do clima emocional, piorando seu desempenho docente e a aprendizagem dos estudantes, ele poderá compreender essa complicada relação, e optar por reagir com empatia. Por fim, sabe-se que a docência se caracteriza por ser uma atividade profissional complexa que impacta diretamente na saúde mental e física que reverbera na qualidade do ensino. Estar preparado emocionalmente para os conflitos em sala de aula com alunos e no trabalho, é um desafio cotidiano. Não se sinta sozinho(a), compartilhe e converse com seus pares, o desafio parecerá mais leve.

Referências

Alves, Rubem Ostra feliz não faz pérola / Rubem Alves. – São Paulo : Editora Planeta do Brasil, 2008.

EDUCABRAS. Violência nas escolas brasileiras – EducaBras, 2022. https://www.migalhas.com.br/quentes/300479/professora-agredida-por-aluno-em-sala-de-aula-sera-indenizada. Acesso dia 09 de junho de 2023.

MAHONEY, Abigail Alvarenga; ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. Afetividade e processo ensino-aprendizagem: contribuições de Henri Wallon. Psicologia da educação,  São Paulo ,  n. 20, p. 11-30, jun.  2005.  

NEUROCONECTE. Competência Socioemocional do Professor – Impactos | Neuroconecte. Acesso dia 09 de junho de 2023.

SILVA, Maria & LEAL, Ana. (2019). A emoção e seus reflexos na aprendizagem da matemática. Research, Society and Development. 8. 5083813. 10.33448/rsd-v8i3.813.

2 Comments on “COMPETÊNCIA SOCIOEMOCIONAL E O TRABALHO DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR

  1. Que texto maravilhoso!!!! Faz-nos pensar como a baixa tolerância à frustração existe em esferas educacionais onde deveriam ser priorizados o respeito e o diálogo ….
    É preciso ponderar onde se origina o estímulo para se responder a violência com mais violência e se valer de espaços sociais saudáveis para se pensar e combater tais atitudes… Indubitavelmente é papel da familia e da escola apresentar aos jovens como agir com autocontrole quando momentos de tensão virem à tona.
    Em se tratando de adultos, é preciso olhar para a baixa tolerância à frustração com muita atenção e analisar os aspectos psicológicos envolvidos, além de buscar ajuda profissional.

  2. Prof. MAZÉ, a Sra. descreve muito bem o que acontece em sala de aula. Tenho 43 anos de sala de aula, 33 na academia. Já vi coisas tão repugnantes, que até Deus duvida. Os sem almas, estão nos ouvindo, vendo, sentindo nossos desejos e aspirações deles com a vida. Devemos ser bons exemplos. Devemos ser justos, firmes, resilientes, mostrar caminhos, permitir que eles descubram seus potenciais e habilidades, para que quando estiverem na vida extra/muros, sejam conscientes do que são de verdade. Acho que a realidade mostrada no texto, é muito real. O docente deveria ser mais companheiro na caminhada desses alunos, sem comentários ridículos que ao invés de agregar, desagregam. Somos o retrato deles, não podemos ter preconceitos de nenhum tipo e não externar nossas ideologias, pois sala de aula não é palanque. Fui aluno e já sofri muitos comentários não condizentes e mesmo como docente, também já passei por esses comportamentos indignos. Dra. A senhora foi na raiz do problema. Talvez nossos professores achem que o aluno chega na academia totalmente ileso dos traumas sociais que sempre existiram. Obrigado.

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